sábado, 19 de fevereiro de 2011

Literatura nacional - Penumbra - Rafael Sales

Boa tarde leitores! Hoje lhes trago o prólogo e o primeiro capítulo do livro Penumbra, cujo autor é Rafael Sales. Foi o próprio autor, que é parceiro do blog, quem disponibilizou a leitura. Obrigada Rafael!!!

Prólogo




Às vezes não me sinto só, mesmo trancada em meu quarto eu 
sinto presenças invisíveis e ouço vozes ocultas na escuridão. 
Muitas pessoas vão me chamar de desequilibrada e é por esse 
motivo que mantenho meus sonhos em segredo, neles, anjos, 
demônios e seres fantásticos fazem parte, mas de um modo 
assustador eu me familiarizo com esse mundo ilusório.
Os sonhos estão se tornando cada vez mais frequentes e começo 
a pensar que não faço parte deste plano. É como se alguém 
estivesse pronto para tomar o lugar a qual eu ocupo. É estranho 
pensar que nada o que vivi seja realmente minha história, está 
faltando algo, uma parte tão bem escondida que não sei aonde 
começar a procurar.
Às vezes acho que os anjos e os demônios existem, francamente 
devo estar louca.
Mais insano é pensar que logo terei que me mudar novamente, 
pela primeira vez gosto da onde estou.
Talvez a razão por me sentir viver uma vida que não seja a 
minha, esteja fortemente ligado a estar aqui por falta de escolha.
Eu conheço meu passado, mas tudo que sei de minha origem 
não parece o suficiente, falta algo.
Mas o melhor a se fazer por ora, é parar com os pensamentos 
que não me levaram a parte alguma e deixar minhas pernas me 
levarem de volta a rotina

1 - Despertar


Eu não consigo mais correr, meus pulmões estão totalmente sem ar, não 
posso parar e pensar na direção que devo seguir. Todas aquelas cenas surreais 
fervilham em minha mente.
Era para ser um dia normal, meu primeiro dia em um colégio completamente 
novo, em uma nova cidade.
Eu estava um pouco aliviada, pois teria algumas companhias no meu recente 
local de estudo, havia conhecido alguma amigas da minha "nova mãe". Foi 
gentileza da Sra. Lucassy nos convidar para passar a noite de Natal em sua 
casa, lá conheci Laura Lucassy e suas amigas, todas estudariam no mesmo 
local e isto me deixava mais calma. 
Fui ao colégio a pé, não gostava da idéia de usufruir do Sr. Carlos para me 
levar a quatro quadras dali, eu deixaria ele se divertir com Dona Suellen.
Mal cheguei ao meu destino e já via as garotas me esperando, seus rostos não 
eram nada amigáveis, uma delas disparou em minha direção chorando muito,
apontava para mim e dizia coisas tais como:
"Você não poderia ter feito isso. Como pôde? Você é um demônio! Um 
monstro! Maldita!".
Sua fúria me assustou. Como poderia ter feito alguma coisa, tinha acabado de 
chegar? Conheço bem meu impulso de socar a cara daqueles que não gostava, 
mas não tinha falado com ninguém para sentir essa vontade. Pessoas chegavam
mais perto com expressões assombradas, junto com a multidão, policiais 
miravam suas armas em minha direção.10
"Parada ai garota!". Um deles gritou. "Ela pode ser perigosa, não sabemos 
como fez aquilo, mas tomem cuidado!".
Perigosa? Eu? Não tinha coragem de matar nem ao menos uma barata, tudo 
bem eu sou como um cão que late, mas jamais vai morder.
Foi quando um flash me fez olhar em direção ao colégio no exato momento 
que o prédio inteiro era envolvido por uma bola de fogo e fumaça, uma torre de 
luz irrompeu do incêndio repentino e rasgou o céu antes límpido e azul, agora 
tenebroso e caótico, raios vermelhos cortaram as nuvens chamuscadas 
antecedendo a tempestade que estaria por vir, na real era o prólogo para o 
surgimento da criatura em meio à torre luminosa. Não fui capaz de ver seu rosto, 
entretanto se tratava de uma mulher, isso ficou claro pela silhueta delineada e os 
cabelos esvoaçantes em contraste com a destruição súbita, antes que eu 
pudesse assimilar tudo o que estava acontecendo ao meu redor, um par de asas 
demoníacas irrompeu das costas da mulher no interior da torre luminosa, ela se 
lançou em um rasante veloz vindo em minha direção, tentei recuar e correr, mas 
parei após dar poucos passos antes de colidir na mulher flutuante materializada 
a minha frente.
Ela estava de costas para mim e fiquei a fixar os olhos na tatuagem peculiar na 
parte inferior de suas costas então, suavemente ela se virou, fiquei vislumbrada 
com sua barriga impecável, seus seios nus e redondos, um rosto fino e belo, 
seus cabelos lisos cumpridos e escuros deslizavam pela sua face. Quando seu 
rosto não estava mais camuflado eu a reconheci, estremeci ao ver o semblante 
diante de mim.
Era eu mesma. 
Tentei dar dois passos para trás, os olhos dela me fitavam fumegando em 
brasa vívida, senti duas mãos tocarem meus ombros e uma onda de pavor 
avassalou minhas estruturas.11
Dois rapazes belos surgiram ao meu lado e se destacavam no meio daquele 
caos, eram impossivelmente bonitos, um era branco estava de olhos fechados, 
seus cabelos eram loiros presos em um curto "rabo de cavalo", o outro era 
moreno de cabelos pretos, também permanecia com os olhos cerrados, a única 
coisa que meu desespero me permitiu ver foi o salto imenso da dupla. Não fiquei 
para assistir ao resto.
Corri mais do que minhas pernas suportariam e somente agora pude me 
localizar, parada e assustada no limite da cidade completamente vazia e lúgubre.
A minha frente o vasto bosque mal iluminado, atrás de mim algo impossível de 
se compreender. Qual lugar é seguro ir? Eu não conheço ninguém nessa cidade 
para pedir ajuda. Voltar para casa não é uma opção, pois o colégio está no meio 
do caminho e esse é o ultimo lugar em qual eu quero estar.
Ao me virar avisto minha imagem demoníaca se aproximando com um rasante
feroz. Um de seus braços está esticado em minha direção, já na outra mão ela 
empunha uma adaga e tem como alvo meu peito. Em um átimo ela surge diante 
de mim e agarra meu pescoço. Fecho meus olhos e sinto a lâmina fria ser
enterrada em minha pele. A dor sobe pelas minhas cordas vocais, impulsionada 
pela faca arrancando minha vida, meus olhos se abrem junto com minha boca 
liberando um grito de pavor e angustia.
Tudo se torna branco.
Eu estou morta?
Meu corpo se projeta para frente. Levo minhas mãos aos olhos, a fim de 
desanuviá-los. Sinto o suor escorrer preguiçosamente pela minha pele. Olho ao 
redor com um pânico crescente, entretanto um suspiro de alivio escapa por entre 
meus lábios. Tudo não se passou de um sonho, de um pesadelo terrível. Eu 
estou sentada em minha cama no meu quarto de mobílias antigas, o quadro 12
enorme a minha frente de dois anjos indo de encontro a uma garota acuada e 
indefesa no solo, faz com que calafrios assolem meu corpo por inteiro.
Precisaria de algum tempo para me acostumar com tudo isso, com a riqueza, 
com o luxo, mas tempo é uma coisa a qual não posso me deleitar, logo eu 
estarei me mudando novamente e talvez a nova casa não seja tão bela como 
essa é.
Não demora muito e a Dona Suellen irrompe pela porta do quarto, com um tom 
preocupado ela fala:
- Ouvi seus gritos minha querida. Está tudo bem por aqui? Se machucou? 
Precisa de alguma... – Interrompo a tagarelice matinal, se a deixasse continuar 
não iria parar de falar nunca mais.
  - Eu estou bem Dona Suellen. Não se preocupe. Foi apenas um pesadelo. -
Sorrio para tentar esconder meu medo tão evidente em meu rosto.
- Se precisar pode me chamar, Senhorita Lizie. – Eu realmente odeio os 
termos usados nesta casa.
Me levanto de minha luxuosa cama bem devagar, quero aproveitá-la mais um 
pouco, como o sonho me fez despertar antes do costume, posso ficar aqui por 
mais alguns minutos.
Vou até o armário e noto minhas roupas prediletas ficando no esquecimento. 
Meu guarda-roupa foi completamente modificado, trajes mais elegantes e finos
ficaram no lugar dos mais despojados, muitas roupas compradas por minha 
“mãe” ainda estão em seus sacos plásticos. Ela nunca gostou do meu estilo e 
encontrou na mudança de casa o momento propício para substituir tudo. Já me 
sinto igual aquelas "patricinhas", minha imaginação me assusta às vezes.
Ando pelo corredor tentando encontrar a escada que me levará para a 
cozinha, é evidente minha necessidade de um mapa. Sempre quando me 
acostumo com algum lugar temos que nos mudar de novo.13
Fui adotada por Nuelly aos meus dezesseis anos de idade, desde então já 
passamos por vários lugares, sempre permanecemos nas casas por temporadas 
curtas de alguns meses.
A estadia mais demorada foi quando as obras de Nuelly estavam em 
exposição no Museu de Arte Moderna da cidade de São Paulo.
Nenhuma das outras casas eram tão grandes como esta. Dois meses foram 
insuficientes para me familiarizar com o tamanho deste lugar. Treze quartos, 
uma sala de estar, uma de jantar, uma de visita, mais duas salas que eu não 
tenho idéia de suas finalidades, dois escritórios, uma míni - biblioteca, uma 
cozinha, uma sala de jogos e tantos outros lugares os quais não tive a vontade 
de visitar.
Depois de um tempo finalmente encontro a tão procurada escada e lá de cima 
vejo o Sr. Carlos correndo atrás da Dona Suellen, indo os dois para a cozinha -
nem sinal da minha "mãe" - vou fazendo bastante barulho ao descer os degraus, 
não gostaria de assistir a uma cena intima nesta hora da manhã.
Esses dois, Dona Suellen e o Sr. Carlos, nos acompanham desde quando fui 
adotada. É parte de minha rotina vê-los brincando dessa forma, mesmo assim eu
ainda não me acostumei com suas “brincadeiras” um com o outro.
Ao entrar pela porta do cômodo que mais me agrada – a cozinha – o Sr. Carlos 
abre um largo sorriso amarelado. Ele ainda é bonito, está bem conservado, tem
por volta dos 45 anos, mas ainda age como um garoto. Escondida atrás dele a 
envergonhada Dona Suellen abaixa sua saia, ela também não é velha, aparenta
possuir mais ou menos uns 40 anos, entretanto sua real idade é um mistério. 
Acho tudo isso cômico e retribuo o sorriso igualmente encabulado.
- Quer que eu a leve para a escola Srta. Lizie? – Sr. Carlos pergunta ainda se 
arrumando, tirando todos os amassados da camisa.
Imediatamente penso no sonho de hoje, não quero que ele se torne real.14
- Claro, se não for atrapalhar em nada – Respondo ainda um pouco 
constrangida.
- Eu lhe disse, assim vai acabar fazendo com que a Sra. Nuelly nos bote no 
"olho da rua". – Dona Suellen grita com o pobre mordomo da casa.
Dona Suellen é uma mulher de mil e uma utilidades, faxineira, governanta, 
cozinheira, sempre cuidando de tudo com um carinho especial. Não 
precisávamos de mais ninguém com Dona Suellen trabalhando conosco. 
Depois de muitas broncas e muitas desculpas, o Sr. Carlos e eu conseguimos 
entrar no carro e partir para o colégio.
Olhando pelo vidro do carro sem realmente ver a paisagem do lado de fora, 
perguntas estranhas aparecem em minha cabeça. Por que a Sra. Nuelly teria me 
adotado? Eu já tinha 16 anos quando fui escolhida por ela, havia muitas outras 
crianças lindas com menos idade naquele orfanato, no entanto ela queria 
justamente a mais velha. Não reclamo do meu destino, mas sempre tive vontade 
de lhe perguntar estas coisas, mas minha "mãe" vivi para o trabalho e foi esse 
motivo o qual nos levou a se mudarmos para esta cidade, suas obras estão 
expostas aqui este ano.
Nuelly tem desenhos magníficos e misteriosos, a pintura do meu quarto, por 
exemplo, foi ela mesma quem a confeccionou. 
O fato de não me recordar do rosto de minha mãe sempre me traz tristeza. 
Não tinha como eu me lembrar de suas feições, ela morreu no dia do meu 
nascimento. Pensar que em breve teremos que nos mudar também não me 
deixa feliz, daqui a alguns meses estaremos indo para uma nova cidade, 
completamente desconhecida aonde eu não terei nenhum amigo ou amiga. Algo 
me deixa em duvidas sobre o sentimento fraternal que Nuelly nutre por mim, com 
certeza seu modo frio e calculista não me ajuda na conclusão de tudo isso.15
Quando chego ao colégio fico feliz em ver os sorrisos perfeitos de Jeane, 
Camy e Laura, elas não estão chorando como havia sonhado. Os outros 
estudantes também não estão apavorados, todos acenam para mim, como se eu 
fosse muito conhecida.
O que estou pensando? Realmente acredito que o sonho dessa manhã poderá 
se tornar realidade?
- Bom dia, Lizie, você esta linda. – Camy é a primeira a falar comigo.
Lógico que eu estou linda. Parecemos irmãs gêmeas trajando o uniforme do 
colégio, outro fato o qual me deixa muito bela é por eu ser a filha da mais nova 
atração turística da cidade.
Camy Moss é a mais baixa do grupo, seus óculos redondos ocultam seus 
lindos olhos azuis, seu cabelo curto e escuro possui as pontas viradas para fora, 
sempre agarrada com seus livros. Desde a primeira vez que a vi, no Natal na 
casa dos Lucassy, fiquei com a estranha sensação que com ela eu devo tomar 
cuidado, tudo indica que ela é a origem da falsidade. Jeane Ledger tem os 
cabelos muito lisos e negros em contraste com seus olhos verdes, ela é a mais 
presunçosa, olhando todos do alto. As duas moram juntas a um bom tempo, a 
herança que o Sr. Ledger deixou para sua filha deve ser o suficiente para manter 
seu padrão caro de vida por anos.
Eu sei que a família Moss é influente no universo financeiro, porem nunca ouvi 
ninguém falar na família de Camy. Com certeza ela recebe uma boa pensão 
para morar aqui.
Laura Lucassy é a mais gentil, seus cabelos loiros e ondulados sempre estão 
caídos sobre seus seios volumosos, seu belo rosto de porcelana sustenta um 
par de olhos escuros e enigmáticos, confesso que por instantes mergulhei na 
formosura de suas feições. A simpatia e a timidez se misturam com perfeição em 
seus gestos despretensiosos. 16
- Você chegou na hora certa, Lizie, os rapazes do circo acabaram de chegar 
ao colégio. – Camy me diz apontando para um grupo grande a nossa frente.
- Circo? – Pergunto.
- Não sabia? Nossa cidade possui um circo há algum tempo e alguns dos 
rapazes estão matriculados no colégio. Um colírio para os olhos. Seus corpos 
são t...
- Quieta Camy, são apenas circenses. – Jeane fala demonstrando bastante 
hostilidade ao comentário da pequena falante.
Camy me faz olhar o grupo isolado no canto do jardim. O pessoal do circo, os 
mais jovens, estão em cinco pessoas, olho rapidamente só para deixar Camy 
alegre, mas três deles fazem meu sangue correr mais rápido.
Dois rapazes se destacam do pequeno bando, não posso acreditar, mas os 
mesmos rapazes do meu sonho estão ali, diante de meus olhos. Fico pasma ao 
associar aqueles dois com meu pesadelo. O garoto branco de olhos azuis e 
cabelos loiros, junto com o moreno de madeixas escuras conversam com uma 
garota que também me chama atenção. Com uma expressão selvagem, cabelos 
enrolados e presos, esvoaçando ao vento, seus olhos castanhos me fitam 
subitamente. Meu rosto é tomado por uma expressão de imenso pavor.
Agora só falta ver o clarão, a escola explodindo e sei o que acontecerá
depois.
Sinto um forte impacto no braço e os livros caem na grama do pátio.
Minhas pernas estão prontas para correr, porem um timbre calmo preenche
meus ouvidos fazendo meu pavor esvair. 
- Me desculpe senhorita.
O dono da voz é ainda mais belo. Um rapaz de cabelos pretos na altura dos 
ombros, com mexas caindo sobre os olhos quase brancos - o tom de cinza é17
gritante em seu globo ocular -. Rosto fino. Braços definidos e fortes. Peito 
vigoroso enfatizado abaixo da camisa clara.
Não sei por quanto tempo fiquei a admirá-lo. Todos nesta escola parecem
surpreendentemente perfeitos, não deixam meus olhos verdes e meus cabelos 
vermelhos sobre minha pele branca ter qualquer impacto na multidão.
- Espero que não tenha se machucado. Seria um pecado ferir uma pele tão 
macia. – Com certeza agora ele está mentindo. – Prazer, meu nome é Dominus 
Dolensk.
- Lizie Adágio. - A única coisa na qual sou capaz de falar sem se atrapalhar 
com as palavras.
- Fico feliz em poder conhecer a filha da Sra. Nuelly Adágio. Tão encantadora 
quanto à mãe
Enrubesço de imediato. É bom ter o ego massageado logo de manhã por um 
garoto tão lindo – mesmo que seja cego.
O sinal toca.
- Então, Ate mais tarde. Tenho a convicção que nos veremos em breve. – Ele 
acena e parte.
Por um momento sinto medo de suas palavras e no outro sinto medo de 
Dominus, tive a sensação que seus exóticos olhos acinzentados haviam se 
transformados em dois diamantes luzidos no momento que ele olhou para trás.
Vou até a diretoria pegar meu horário de aula e entregar meu bilhete de 
apresentação com Dominus Dolensk no pensamento. Quem será aquele rapaz 
de olhar assombroso?
A secretaria sorri quando entro, pega meu bilhete de apresentação e me 
entrega os horários das aulas.
Pensar em Dominus teria que ficar para mais tarde, pois decifrar o gabarito é
uma missão impossível para mim. As salas são diferentes em cada matéria e 18
isso só irá me atrasar mais – Quem construiu esse mapa com certeza não 
pensou em calouros.
- Perdida? - Alguém havia descoberto o obvio.
- Um pouco. – Minha arrogância natural não irá se revelar agora.
- Deixe me ver isso ai – Uma menina com cachos ruivos e pequenas sarnas no 
rosto apanha o papel. - Nossa que coincidência.
- O que aconteceu Kate? – Uma garota fala ao longe
Minha cabeça dá vários nós. A menina na minha frente é idêntica à outra um 
pouco mais distante.
- Me desculpe não me apresentei. Sou Kate Adam. – Ela sorri e beija minhas 
bochechas três vezes.
- Eu sou Katrine Adam, irmã de Kate. – A outra menina repete o gesto da 
anterior, um perfeito dejá vu. 
- Vocês, são gêmeas? – eu poderia perguntar outra coisa, mas porque perder 
a chance de ser idiota.
As duas riram como se eu tivesse contado alguma piada. Provavelmente riam 
da piada que eu sou.
- Você tem muita sorte... – Kate para e olha para mim tentando se lembrar de 
algo que eu não havia dito ainda.
- Lizie Adágio. – me apresento.
- Claro a filha da pintora – Katrine acrescenta.
- A sua primeira aula e conosco, Lizie.
Elas me guiam pelos corredores sem fim, me apontam as salas que eu devo ir 
nas próximas aulas.
Enfim chegamos à sala, menos atrasada do que imaginei.
E é nesse momento que descubro que meu ano letivo não será o mais fácil.19
Dominus senta a três carteiras atrás de mim na aula de Literatura. Posso sentilo me olhando como se estivesse vendo através da minha pele branca. Ainda na 
aula de Literatura descubro o nome do garoto circense loiro, o intruso em meus 
sonhos. Ele se chama Stark Clavvy.
Tive que suportar por uma hora o falatório das gêmeas, os olhares fulminantes 
de Dominus Dolensk e a presença sombria de Stark Clavvy, mesmo com ele 
sentado a cinco fileiras de distancia eu podia sentir a brisa gélida vinda de sua 
direção, me fazendo recordar do sonho a manhã inteira. Cada recordação uma 
nova onda de angustia.
A aula seguinte foi mais tranquila. Fiquei muito ocupada com os cálculos 
impossíveis que a professora Saiory despejou sobre todos. As gêmeas também
são da minha sala de Matemática e foi nesse momento que descobri que não é
tão ruim ter elas por perto.
O intervalo das aulas foi calmo, com muitas risadas entre nós, sempre 
causadas por Camy e Jeane que fazia ela se lembrar que "somos da elite" e 
algumas palavras ou comentários não poderiam ser ditos, porém Camy sempre 
se esquecia disso.
Se não fosse pela estranha sensação de alerta contra Camy, provavelmente 
seriamos boas amigas.
Kate e Katrine não ficaram conosco no intervalo. Elas deixaram claro a 
incompatibilidade com Camy Moss, mas também não ficaram muito longe, 
passaram o intervalo com outro grupo. De fato eles eram mais reclusos. Kate 
havia me falado deles nas pausas da aula de Matemática.
O galanteador alto e forte de cabelos castanhos e olhos amendoados 
provavelmente seria Martin Riordan. O rapaz loiro do outro lado seria Lawrence 
Slake e a garota de cachos pretos certamente seria Aleksandra Ramos. Eles 20
formam um grupo um tanto peculiar. Martin e Lawrence permanecem a metros 
de distancia, como se fossem pólos negativos se repelindo.
Confesso que me sinto enjoada ao ver como Aleksandra acaricia os dois 
meninos. Como se eles estivessem em seu comando.
Lawrence às vezes chegava mais perto de nós, mas seu alvo era Laura
Lucassy. Os dois pareciam bons amigos. Talvez ela fosse à única com quem o 
jovem elegante conversava.
Do outro lado do pátio os circenses estavam reunidos, Stark Clavvy, o rapaz 
de cabelos pretos amarrados, a garota de olhar animalesco, o garoto loiro de 
aproximadamente doze anos e o menino careca de expressão triste, avaliando 
todos ao redor. Como Camy Moss havia me dito, eles não conversavam com 
ninguém do colégio, é um grupo exclusivo de artistas circenses.
Retorno para a segunda parte da aula de Matemática. Aqui eu não sinto
vibrações negativas nem mal estar.
Diferente da aula seguinte a qual a garota selvagem chamada Aislyn Greyve 
seria minha "companheira" de aula.
Ela me encarou por varias vezes e quando eu encontrava com seus olhos 
caramelizados, ela se curvava sobre seu caderno, escrevendo compulsivamente.
Não fiquei livre de Aislyn, assim que entrei na sala de História, lá estava ela ao 
lado de Stark e de seu outro amigo, Joshua Greyve.
Joshua e Aislyn não parecem irmãos, entretanto seus sobrenomes são os 
mesmos. Talvez sejam primos ou algo do tipo.
Fui capaz de perceber que Stark era o que menos prestava atenção na aula da 
Sra. Marta, entretanto sempre respondia a todas as perguntas com uma exatidão 
inacreditável. Até parece que ele esteve lá quando tudo aconteceu.
Meus pensamentos ficavam doentios a cada minuto que eu passava na sala 
com aquelas três pessoas misteriosas.21
Como havia esperado o dia de aula acabou.
Jeane, Camy, Laura e eu saímos tranquilamente do colégio. Não percebo que 
estamos sendo seguidas até chegar ao carro onde o Sr. Carlos me espera,
olhando de um modo espantado. Não exatamente para mim, mas sim para quem
me segue.
Não quis olhar para trás, talvez fosse à criatura alada dos meus sonhos – Não 
podia ser ela, o colégio ainda está de pé, penso.
Um barulho alto de passos ativa meus nervos, me fazendo, por reflexo, me 
virar de encontro ao inimaginável.
Um milésimo de alivio toma minha alma, entretanto o medo ainda é presente.
Aislyn Greyve me olha como se estivesse pronta para atacar a qualquer 
momento, mas isso não acontece. Ela simplesmente tira um papel do bolso largo 
da calça folgada e estica seus dedos segurando trêmula o pedaço de papel.
A garota do circo está tentando um contado indireto?
- Me pediram para lhe entregar isso. Não se assuste muito. Você não vai 
entender nada. Sua mente ainda é fraca para isso, mas em breve irá descobrir o 
que o futuro tem reservado para você. – Sua voz é grave e profunda com um tom 
indolente e sem vida. Típica de uma cigana medíocre.
A garota de trejeitos selvagem dá a volta no carro como se não estivesse 
vendo ninguém ao redor e se junta aos outros circenses do outro lado da rua.  
Assim que entro no carro reparo o quanto minhas mãos suam, estou com uma 
curiosidade anormal para saber o que contém nesse papel.
Não consigo me conter e a caminho de casa abro o bilhete o qual foi escrito 
com uma caligrafia bela e desenhada, mas as palavras escritas não fazem o 
menor sentido, paro para ler novamente, desta vez com mais calma, tento
absorver as informações.22
No décimo oitavo ano de gestação da alma repugnante e destruidora, seu 
recipiente estará pronto para receber aquele que ira dar fim aos pecados 
humanos.
A alma incompleta no seu décimo oitavo ano de existência se revelará 
para um mundo desconhecido e o conhecimento sobre o sobrenatural será a 
sua destruição.
- Srta. Lizie já chegamos. – O Sr. Carlos me desperta de meu transe.
De certa forma eu sei que estas palavras estão ligadas ao meu sonho, sinto
uma certeza assombrosa nisso, entretanto não consigo ligar as duas coisas.
Muitas perguntas ficam em minha mente.
Quem são aquelas pessoas? - eles não são somente artistas de circo.
Por que da imagem de Dominus Dolensk não sai da minha cabeça?
Por que meus pensamentos em meio a tanta confusão ainda acham um tempo 
para focar em Laura Lucassy. 
Qual é o caminho para meu quarto? 
Me perco de novo em minha casa



Peço desculpas a vocês e ao Rafael por não ter colocado as imagens (que são lindas!), mas tentei de tudo e não tive bons resultados.
Para mais informações, visitem o blog do livro, que é http://www.projeto-penumbra.blogspot.com/ , vocês vão adorar! Para quem gostou tanto quanto eu do início da história, o livro já está à venda. Para mais informações, acessem o blog já linkado.
Beijos, Nika *_*



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